II Colóquio de Estudos Germânicos “Mito e magia”

17 a 20.10.06

Faculdade de Ciências e Letras da UNESP/Araraquara

 

RESUMOS DAS PALESTRAS

 

Profª Drª Suzi Frankl Sperber (UNICAMP)

Título: A lenda da flor azul, o mito e o conto de fadas

Resumo: Quem acha uma flor azul, encontra tesouros raros: a nostalgia do objeto mágico pela beleza e por seu poder corresponde a anseios ancestrais de onipotência (magia), configurados pela força da fantasia, do imaginário. Pretendo traçar, a partir deste anseio, as características do mito, do conto de fadas e da lenda, apresentando nuanças importantes, que distinguem as três formas - do mito, do conto de fadas e da lenda - entre si.

 

 

 

Profª Drª Eloá Di Pierro Heise (USP)

Título: O homem entre Deus e o demônio: o mito fáustico

Resumo: A palestra discute o mito fáustico nas peças de Goethe – Urfaust (1790), Faust I (1808) e Faust II (1832) –, interligando as figuras de Fausto e Mefistófeles ao pensamento do Classicismo de Weimar e seus conceitos-chave de “Humanität” e “Weltliteratur”.

 

 

 

Profª Drª Ramira Maria Siqueira da Silva Pires (UNESP-Araraquara)

Título: A ficção gótica inglesa: origem e desenvolvimentos

Resumo: O romance gótico, inaugurado por Horace Walpole, em 1764, teve seu grande momento na década de 1790 e permaneceu um gênero bastante influente ao longo do Romantismo. Durante o vitorianismo, marcado por uma tendência mais realista, elementos do gótico fazem-se presentes em obras fundamentais de Emily e Charlotte Brönte e de Charles Dickens. A década de 1890, conhecida como “finde siècle”, viu o resurgimento do romance gótico em obras de Robert Louis Stevenson (O Estranho Caso do Dr. Jekyll e do Sr. Hyde), Oscar Wilde (O Retrato de Dorian Gray), Bram Stoker (Dracula) e de Henry James (A Volta do Parafuso). A partir do século XX, o gótico expande-se de forma inimaginável. Para alguns, o gótico tem hoje a ver com momentos particulares, tropos e motivos disseminados pela literatura e de forma geral pela cultura ocidental contemporânea. Para outros, ainda se produz uma literatura genuinamente gótica, com seus subgêneros: a história de terror, a história de fantasma o tecnogótico, com suas óbvias ligações ao gótico original – o espaço insólito, a perseguição, a virtude em perigo, segredos do passado que assombram o presente – mas com especificidades não menos importantes, ligadas a ansiedades que assombram nossa sociedade onde circulam, à altíssima velocidade, excessos de informações e bens de consumo. Buscaremos, nesta palestra, perseguir o desenvolvimento deste gênero que há duzentos e cinqüenta anos povoa nossa imaginação.

 

 

 

Profª Drª Guacira Marcondes Machado Leite (UNESP-Araraquara)

Título: Gérard de Nerval: da Alemanha aos contos folclóricos do Valois

Resumo: Os 150 anos do falecimento de Gérard de Nerval, celebrado em 2005, foram lembrados com a publicação de novas edições de sua obra e de grande número de estudos dedicados a ela. Trata-se de um autor do romantismo francês que se destacou pela tradução do Fausto e de poesias e baladas alemãs. Graças ao contato com a literatura alemã e com a Alemanha, que visitou mais de uma vez, pode-se pensar que Nerval se interessou, na França, pela colheita de baladas e contos folclóricos de sua região. Em Chansons et légendes du Valois, inserida por ele em Les Filles du Feu, em 1854, o autor revela uma parte do patrimônio popular do Valois, atestando um interesse que compartilha com os românticos em geral, mas que, nele,se mistura também a lembranças de infância que lhe são caras.

 

 

 

Prof. Dr. Pedro Theobald (PUCRS/UFRGS)

Título: Ficcionalização pela via oblíqua

Resumo: O desconforto com o “pronomezinho irritante” não impediu Graciliano Ramos de reconstituir literariamente dois períodos de sua vida: o primeiro, em Infância (1945) e o segundo em Memórias do cárcere (1953). Nessas obras, que transcendem o memorialismo e a autobiografia tout court, a matéria da própria vida, embora relatada na primeira pessoa, adquire dimensões míticas que lhe conferem validade universal. Outros autores procuraram caminho diverso na busca de tais dimensões. Referimo-nos aqui, especificamente, a dois deles, de períodos e ambientes diferentes. Em primeiro lugar, a Karl Philip Moritz (1756-1793), alemão e contemporâneo de Goethe, de quem partilhou por algum tempo a companhia, mas não a boa fortuna. Encorajado pela leitura das Confissões de Rousseau, Moritz tenta, em Anton Reiser (1785-90), escrever o romance da própria vida. Era seu objetivo efetuar uma auto-análise, colocando à mostra “um caso exemplar de auto-alienação” (Hoffmann-Rösch). Como o próprio título indica, Moritz enxerga a si mesmo no protagonista andarilho Anton. O autor, disfarçado na figura do narrador, narra os acontecimentos na terceira pessoa, revelando-nos as experiências dolorosas e constrangedoras da privação física, as frustrações do autodidatismo e das tentativas de evasão através do teatro. Já Gertrude Stein (1874-1946), americana, auto-exilada em Paris pela maior parte de sua vida, adota um recurso singular em sua Autobiografia de Alice B. Toklas (1933). Nessa obra, Alice B. Toklas, na vida real companheira e secretária de Gertrude, constitui tão-somente a persona assumida pela autora, que é a verdadeira biografada. Assim, temos pouco da história da Alice, mas muito da de Gertrude, que “se vê” através dos olhos da companheira. Confessadamente, tal recurso segue o modelo de Daniel Defoe, que, igualmente sem constrangimento algum, escrevera a “autobiografia” de Robinson Crusoe... A presente palestra, através de citações de Moritz e Stein, procura explorar as conseqüências estruturais e de sentido que derivam da adoção do ponto de vista alheio na narração da própria vida.

 

 

 

Profª Drª Wilma Patrícia Marzari Dinardo Maas (UNESP-Araraquara)

Título: A formação do pícaro. O Felix Krull de Thomas Mann e a tradição goethiana

Resumo: Obra tardia de Mann, As confissões do impostor Felix Krull constitui um exemplo singular da apropriação da tradição goethiana do romance de formação. A linguagem apurada, assim como as passagens que entretêm relação quase que intertextual com a dicção confessional da autobiografia goethiana e com Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister, paradigma do romance de formação, contrastam saborosamente com o currículo avesturesco do protagonista Krull, assim como com sua origem pequeno-burguesa. Seu gosto pelo disfarce e constante troca de identidade fazem de Felix Krull um pícaro, espécie de antípoda do Wilhelm Meister goethiano. Enquanto Meister é movido pelo seu “desejo e intenção” de se aperfeiçoar (“sich ausbilden”), acentuando seus talentos e qualidades inatos e individuais, a trajetória de Krull é construída por uma sucessão de disfarces e assunção e falsas identidades, em busca da total anulação da identidade civil burguesa. O Felix Krull de Thomas Mann pode ser lido, portanto, como contraponto da estetização da existência defendida por Goethe tanto em seu romance Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister quanto em sua autobiografia Poesia e verdade.

 

 

 

Prof. Dr. João Azenha Jr. (USP)

Título: A tradução de imagens nacionais: do mundo real para o interior do discurso

Resumo: A presente palestra tem por objetivo enfocar a questão da tradução de imagens nacionais, na literatura e em outros domínios discursivos, a partir da perspectiva de dois conceitos: de um lado, o caráter dinâmico observado na constituição e na transformação de imagens nacionais, enquanto correlato do processo mesmo de constituição de sentido; de outro, a noção de imagem como representação, isto é, como conceito atrelado menos a um referencial e mais a recursos empregados na tessitura do discurso. A adoção dessa perspectiva sugere que o problema da tradução de imagens nacionais vem passando por um processo que se poderia chamar de “desmaterialização”: as referências concretas, associadas a itens do mundo referencial, extralingüístico – espaço consensualmente adotado como decisivo para a localização dessa problemática desde os trabalhos de Nida e Taber (1969) –, dão lugar a mecanismos discursivos que configuram pontos de vistas. O reconhecimento dessa transformação tem conseqüências importantes para a tradução, que vão desde uma revisão das noções de responsabilidade do tradutor e ética do traduzir até ao treino de tradutores aprendizes, que requer, mais do que nunca, um trabalho interativo com várias áreas afins aos Estudos da Linguagem.

 

 

 

Profª Drª Maria Aparecida Barbosa (UFSC)

Título: A arte de Cardillac – um exemplo de construção literária

Resumo: Em vários dos seus 80 contos, e em seus dois romances, o autor alemão E. T. A. Hoffmann (1776-1822) constrói figuras com uma forte personalidade artística. Eis algumas ilustrações do perfil: Ritter Gluck, o compositor consagrado, é o personagem que tem uma participação anacrônica, anos após sua morte, no conto homônimo; o primo poeta doente, voyeuer à espreita numa janela, protagonista do último conto do autor, denominado “A Janela do Meu Primo”; o estudante Anselmo, de “O Pote de Ouro”, um jovem em conflito entre a vida burguesa e a dedicação à poesia; Kreisler, o músico, Murr, o gato escritor e duplo de Kreisler, ambos personagens do romance que o escritor deixou inacabado, A Visão de Mundo do Gato Murr; ou mesmo Francesco, o pintor renascentista do romance Os Elixires do Diabo. É possível enumerar ainda muitos outros tipos de personagens afins, indivíduos dotados de apurada sensibilidade estética. Pretendo me deter, nesta apresentação dentro do Evento de Germânicos, sobre um personagem do conto longo “A Senhorita de Scuderi”, o joalheiro e artesão Cardillac, incluído no rol de herói-artista bastante típico na literatura de Hoffmann. A diligência do ourives cabisbaixo e ocupado em seu ateliê, na dedicação insana de proporcionar concretude aos projetos, vem ao encontro das leituras do filósofo Maurice Blanchot a respeito do trabalho do autor. A analogia da atividade de Cardillac com a incompletude implícita no ofício de inscrição das palavras na construção da obra literária parece-me evidente, e a considero também uma metáfora muito rica para discutir a atualidade da obra de Hoffmann.

 

 

 

Profª Drª Claudia Sibylle Dornbusch (USP)

Título: Da magia do raio x: a tela demoníaca n’A montanha mágica

Resumo: No quinto capítulo d’A montanha mágica, de Thomas Mann, lemos, no subcaptítulo “Mein Gott, ich sehe!” a descrição de uma sessão de raio x por que passam o personagem principal, Hans Castorp, e seu primo, Joachim Ziemßen, no Sanatório Berghof, em Davos, na Suíça. O impacto sofrido por Castorp quando observa o corpo do primo através de uma chapa iluminada em uma sala escurecida leva-nos à associação com elementos cinematográficos de que nos fala Lotte Eisner em sua obra A tela demoníaca. Tentaremos, aqui, analisar os desdobramentos da magia dessa revelação visionária.

 

 

 

Prof. Nilson Carlos Moulin Louzada

Título: Calvino narrador: encantar e desencantar

Resumo:

FÁBULAS ITALIANAS: visão e voz do tradutor, co-autor

. da tradição oral ao registro escrito em "norma urbana culta"

 - século XIX: registro de diferentes tradições orais (camponesas)

 - século XX: Ítalo Calvino revisita os textos do século XIX

  - algumas escolhas polêmicas: registro "alto" versus registro popular; dimensões escatológicas: sua higienização

   . cotejo com fábulas da tradição oral africana

-        fábulas moçambicanas: transcrição para livros didáticos

 

 

 

Prof. Dr. Mamede Mustafa Jarouche (USP)

Título: A tradução de ‘As mil e uma noites’

Resumo: Obra de capital importância para a ficção ocidental, o Livro das mil e uma noites ainda não conhecia, trezentos anos após a publicação de sua primeira versão para uma língua ocidental, o francês, uma tradução direta para a língua portuguesa. Esse foi o estímulo inicial para o projeto de sua tradução, completa, ao português, a partir da reunião dos originais árabes mais significativos e seu agrupamento filológico em dois ramos distintos, conforme os vem classificando a crítica: o sírio e o egípcio. Com base nessa divisão, iniciou-se o trabalho de tradução propriamente dito, do qual já se publicaram dois volumes em 2005.

 

 

 

Prof. Nestor Müller

Título: A nossa herança - quem diria? – árabe

Resumo: Os árabes forneceram subsídios de importância capital para a cultura e o pensamento ocidentais. O objetivo da palestra é traçar um panorama dos principais momentos e resultados dessa relação biunívoca entre culturas e enfatizar a imensa contribuição árabe nos campos da arte e ciência.

 

 

 

Profª Drª Karin Volobuef (UNESP-Araraquara)

Título: As mil e uma noites e a literatura alemã

Resumo: A tradução de As mil e uma noites em 1704-1717 por Galland na França desencadeou grande fascínio pelo gênero do maravilhoso (no sentido de Todorov) e curiosidade pelo mundo árabe. Na Alemanha, já no próprio século XVIII começam a surgir obras literárias construídas segundo a estrutura da narrativa-emoldura (Rahmenerzählung), que remonta a Boccaccio e a As mil e uma noites, podendo-se enumerar: Unterhaltungen deutscher Ausgewandeter (1795); Phantasus (1812); Die Serapions-Brüder (1819-1821); Das Wirtshaus im Spessart (1827-1828); Die Leute von Seldwyla (1856). A palestra tem como propósito comentar especificamente a retomada das Noites por Hauff e Keller.

 

 

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